FECHADO PARA BALANÇO
NALDOVELHO Chapéu Panamá, terno de linho branco, cravo vermelho na lapela. Uma pulseira de ouro onde se podia ler gravado o nome Rosangela e a dedicatória: com todo o amor que eu tenho. Histórias da malandragem, presente dado, presente devolvido, após adultério. E o pior é que nem foi com outro malandro. Segundo contam, foi de mulher com mulher. Sexta-feira, dia de rodar pela Lapa, Mestre Jorjão marcava presença nas boates, esquinas perdidas, e tinha sempre mais uma saidera, afinal a noite era uma criança e só ao raiar do dia ele voltava para casa e pros braços da mulata, mistura de rosa e anjo, toda certinha e aconchegante. Só que naquela sexta, por conta de uma indisposição, Mestre Jorjão voltou para casa mais cedo e ao chegar, escutou barulhos estranhos, tipo vem cá meu bem e se acaba comigo, me enlouquece e me faz um estrago. Parecia mais coisa feita em encruzo, trabalho de Pomba Gira, ou coisa assim... Não se fez de rogado: uma escada, o silêncio, o cuidado e logo, logo, a cena de amor. Duas mulheres se entregavam, se tocavam e num emaranhado de pêlos, gemidos, suores e orgasmos. Janela entreaberta denunciava o cenário, e para surpresa do malandro traído, na verdade a vizinha do lado com quem ele já havia feito do avesso, e que agora se esbaldava nas coxas molhadas daquela por quem tanto amor ele sentia. Ficou em silêncio apreciando a cena... Ficou até excitado. Nada que pudesse fazer. Nem coragem teve para interromper. Saiu de fininho, deu uma volta pelo bairro e umas horas depois voltou. Quarto em silêncio, como se nada houvesse acontecido. Abriu a porta, acendeu a luz e nada, Rosângela havia partido. Em cima do travesseiro um bilhete e a pulseira de ouro: "desculpa nego, não deu pra segurar, fui embora com Comadre Elvira, nem adianta me procurar". De lá pra cá, Mestre Jorjão ficou mais arisco, nem quer ouvir falar em morar junto, prefere as putas da Lapa. Dão menos trabalho, cobram o seu preço e pronto. Nas rodas tudo se sabe à boca pequena. Falar abertamente, nem pensar! Mestre Jorjão tem fama de certeiro, capoeirista refinado, dizem que de Angola. Melhor não provocar. Rosângela? Parece que foi vista pras bandas de São Paulo, porto de Santos. Virou mulher da vida e Comadre Elvira ainda toma conta. Quem viu, conta que continua bonita, com uma certa tristeza nos olhos e um jeito estranho de caminhar. Histórias que vida tem para contar. Malandro esperto e respeitado nas rodas de capoeira, mestre temido... pulseira de ouro ficou de lembrança, coração fechado pra balanço, nunca mais se apaixonar. NALDOVELHO
Enviado por NALDOVELHO em 26/05/2009
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