TEM CERTOS DIAS
NALDOVELHO Tem certos dias que eu acordo limão galego, com a cara feia de dar medo e fico rosnando pras pessoas que passam desavisadas pelo meu raio de ação. Mais pareço fio desencapado, dou choque pra todo o lado e apesar de ficar calado, fuzilo com os olhos o atrevido que insiste em incomodar a minha solidão. São dias de desterro, de recolhimento compulsório e de descrença no meu futuro. Costumo ficar no escuro, deitado, compenetrado em meu leito, sentindo uma coisa estranha, uma ardência danada no peito, sem ânimo, apetite ou desejo. Melhor que houvesse um botão para desligar de mim a existência, cair no vazio, no nada, pois até o pensamento constrange-me o coração. É aí que, como por encanto, ato de Deus ou coisa assim, corre em meu corpo uma energia, um calor e um desassossego que faz com que eu entorne o meu pranto, em lágrimas secas, poemas a materializar meus problemas, coisas que eu nem percebia, que viviam entranhadas e estranhas; dores, chagas, lamentos, situações não resolvidas que ao serem expostas feridas, deixam de doer-me à alma. É aí então que tudo se acalma num sorriso irônico e abusado, pois não foi desta feita que a vida deixou de valer a pena, pois não foi desta feita que a dor fez deste poeta uma sombra, um arremedo de existência. E aí eu me ponho a orar, agradecido por ser um poeta e, assim sendo, conseguir dissolver sentimentos cristalizados e por ser capaz de, com os meus versos, construir em mim mesmo, um ser cada vez mais inteiro que ao ter a coragem dos loucos, vive em busca de si mesmo, vive em busca da compreensão. NALDOVELHO
Enviado por NALDOVELHO em 11/06/2009
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